Josias de Souza, colunista do UOL
O principal atributo do período pós-Bolsonaro era a percepção de que nada seria como antes. O excesso de caos havia transformado o Brasil num lugar ideal no mapa para a implantação de um governo inteiramente novo. Mas a gestão Lula 3, a caminho dos 100 dias, ainda não dispõe de uma marca. O novo Lula é o mesmo. Dedica-se a reciclar programas de antigas gestões petistas. Nesta segunda-feira, relançou o programa Mais Médicos.
Na semana passada, Lula recriou o Pronasci, Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania. Em semanas anteriores, reembalou o Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida —duas logomarcas que Bolsonaro havia piorado e rebatizado de Auxílio Brasil e Casa Verde e Amarela. Nos próximos dias, Lula pretende reembrulhar para presente velhas obras paralisadas. Serão retomadas sob o guarda-chuva de um programa cujo nome provisório é “Novo PAC.”
Na cerimônia de relançamento do Mais Médicos, Lula declarou: “Completamos 80 dias e, nesses 80 dias, nós não temos feito outra coisa a não ser tentar recuperar tudo aquilo que tinha sido feito de bom, que tinha dado certo, e foi destruído”. É como se Lula culpasse Bolsonaro por sua dificuldade de transmitir uma simbologia contemporânea. Ele promete que, a partir dos 100 dias, seu governo vai “começar a fazer coisas novas”.
Ironicamente, a ansiedade para produzir algo novo inspira desconfiança quanto à capacidade de Lula de reproduzir uma marca da sua primeira gestão: a responsabilidade fiscal que serviu de alavanca para o êxito social. Do ponto de vista político, o terceiro mandato de Lula é feito de centrão e continuidade. O futuro dirá se as concessões resultarão em boas reformas.
Vistas as coisas da perspectiva de hoje, o problema não se limita à dificuldade de Lula de realizar o governo inteiramente novo que prometeu na campanha. A questão é que Lula parece cada vez mais igual a si mesmo. O alarme da popularidade ainda não soou porque a maioria dos brasileiros sabe que nada de mal acontece no Brasil de hoje que não seja esplêndido diante do que poderia acontecer caso Bolsonaro tivesse obtido a reeleição. Mas a sensação de alívio costuma ter prazo de validade.
JOSIAS DE SOUZA – UOL