O congelamento de despesas no Orçamento de 2024 atingiu programas como o Farmácia Popular e o Auxílio Gás, que beneficiam a população mais pobre.
O governo impôs contingenciamento e bloqueios de despesas que somam R$ 15 bilhões, cifra que recaiu sobre gastos de ministérios, PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e emendas parlamentares. A verba foi travada para cumprir as regras do arcabouço fiscal.
Os dados estão disponíveis no Painel do Orçamento e mostram que a ação orçamentária mais atingida até agora custeia de entrega gratuita de medicamentos pelo Ministério da Saúde.
Essa modalidade do Farmácia Popular teve R$ 1,7 bilhão bloqueado. A cifra equivale a cerca de metade do orçamento que ainda poderia ser empenhado.
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O Farmácia Popular já havia perdido cerca de R$ 260 milhões durante o ano. O valor também considera despesas canceladas na modalidade que oferece produtos com descontos.
Questionado, o Ministério da Saúde afirmou, em nota, que não haverá impacto no funcionamento do Farmácia Popular nem na sua projeção de crescimento.
"O bloqueio no programa refere-se a uma reserva técnica que seria direcionada a outra iniciativa. Cabe ressaltar ainda que, caso necessário, há possibilidade de recomposição do valor durante o exercício por meio de remanejamentos", diz a nota.
A pasta afirma que, mesmo com a contenção de gastos, orçamento da iniciativa continuará maior que dos anos anteriores. Estão previstos, diz a pasta, R$ 3,4 bilhões neste ano, o que significa aumento 37% com relação a 2022 (R$ 2,48 bilhões), último ano governo Jair Bolsonaro (PL).
Já o Auxílio Gás teve R$ 580 milhões bloqueados, cerca de um terço do recurso que ainda pode ser empenhado do programa.
Pago a cada dois meses, o vale-gás custeia a compra de um botijão de gás de cozinha de 13 quilos. O valor a ser pago é definido conforme o preço médio do gás nos últimos seis meses, de acordo com pesquisa da ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis). Em junho, o governo pagou R$ 102 a 5,81 milhões de família.
Podem ser beneficiadas pelo auxílio famílias inscritas no CadÚnico (Cadastro Único), com renda familiar mensal por pessoa da família menor ou igual a meio salário mínimo, hoje em R$ 1.412.
O Painel do Orçamento registra nesta quinta-feira (8) cerca de R$ 13 bilhões em despesas já bloqueadas ou contingenciadas, valor que ainda irá subir a R$ 15 bilhões.
Os dados disponíveis apontam ainda bloqueios de R$ 934,4 milhões na ação do Ministério dos Transportes sobre "participação da União em projetos de concessões rodoviárias outorgadas a iniciativa privada". A trava atingiu mais de 80% da verba disponível nessa rubrica.
A pasta dos Transportes também bloqueou R$ 458 milhões dos R$ 577 milhões disponíveis para participação da União em projetos de concessões ferroviárias outorgadas ao setor privado. Procurado, o ministério ainda não se manifestou sobre o impacto da trava nas despesas.
Uma das bandeiras da Saúde sob Lula, o Farmácia Popular entrega gratuitamente remédios para diabetes, asma, hipertensão, glaucoma, Parkinson, entre outras doenças.
No começo de julho, a ministra da Saúde, Nísia Trindade, anunciou a ampliação do rol de produtos entregues de graça nas farmácias conveniadas.
O programa ainda subsidia descontos de até 90% em produtos como fraldas geriátricas e medicamentos para diabetes e doença cardiovascular.
Procurados, os ministérios do Transportes e Desenvolvimento Social ainda não se manifestaram sobre a trava das despesas.
ENTENDA A DIFERENÇA ENTRE BLOQUEIO E CONTINGENCIAMENTO
O novo arcabouço fiscal determina que o governo observe duas regras: um limite de gastos e uma meta de resultado primário (verificada a partir da diferença entre receitas e despesas, descontado a dívida pública).
Ao longo do ano, conforme mudam as projeções para atividade econômica, inflação ou das próprias necessidades dos ministérios para honrar despesas obrigatórias, o governo pode precisar fazer ajustes para garantir o cumprimento das duas regras.
Se o cenário é de aumento das despesas obrigatórias, é necessário fazer um bloqueio nos gastos, ajustando as contas. Se as estimativas apontam uma perda de arrecadação, o instrumento adequado é o contingenciamento.
Como funciona o bloqueio
O governo segue um limite de despesas, distribuído entre gastos obrigatórios (benefícios previdenciários, salários do funcionalismo, pisos de Saúde e Educação) e discricionários (investimentos e custeio de atividades administrativas).
Quando a projeção de uma despesa obrigatória sobe, o governo precisa fazer um bloqueio nos gastos discricionários com investimentos e custeio da atividade administrativa para garantir que haverá espaço suficiente dentro do Orçamento para honrar todas as obrigações.
Como funciona o contingenciamento
O governo segue uma meta fiscal, que mostra se há compromisso de arrecadar mais do que gastar (superávit) ou previsão de que as despesas superem as receitas (déficit). Neste ano, o governo estipulou uma meta zero, que pressupõe equilíbrio entre receitas e despesas.
Como a despesa não pode subir para além do limite, o principal risco para o não cumprimento da meta vem das flutuações na arrecadação. Se as projeções indicam uma receita menos pujante, o governo pode repor o valor com outras medidas, desde que tecnicamente fundamentadas, ou efetuar um contingenciamento sobre as despesas.
Pode haver bloqueio e contingenciamento juntos?
Sim. É possível que, em situação —hoje hipotética— de piora da arrecadação e alta nas despesas obrigatórias, o governo precise aplicar tanto o bloqueio quanto o contingenciamento. Nesse caso, o impacto sobre as despesas discricionárias seria a soma dos dois valores.
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