STF expressa desconforto com a decisão de Alexandre de Moraes de levar golpistas à 1ª Turma

Foto: Brenno Carvalho/ Agência O Globo
Foto: Brenno Carvalho/ Agência O Globo
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27/11/2024 09:39 | 9 min de leitura


A sinalização do ministro Alexandre de Moraes de que levará a trama golpista para julgamento da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) provocou desconforto em uma ala da Corte, que avalia que o plenário seria o melhor ambiente para analisar o tema, considerando a gravidade das acusações e os agentes envolvidos na investigação.

“Essas questões mais relevantes deveriam sempre ir a plenário”, diz um ministro que não vai participar do julgamento e conversou reservadamente com equipe da coluna.

Ministros e integrantes da Corte ouvidos pela equipe da coluna dizem que Moraes quer repetir a votação por unanimidade obtida no caso da suspensão do X para a trama golpista – que, segundo a Polícia Federal, envolvia até a confecção de um plano para matar o próprio ministro, Lula e o vice-presidente Geraldo Alckmin.

Moraes tem influência sobre os os ministros da Primeira Turma e pode conseguir aprovação unânime de suas decisões, já que os dois ministros indicados por Jair Bolsonaro que poderiam divergir dele — André Mendonça e Kassio Nunes Marques — estão na segunda turma.

O rito adotado, de enviar o caso para a turma, está de acordo com o regimento do STF. Mas essas mesmas regras também permitem que o relator — Moraes, no caso — envie o processo para o plenário, caso julgue mais adequado. Interlocutores do ministro, porém, entendem que ele prefere garantir um placar unânime e plena adesão ao seu voto, dissipando os riscos de eventuais resistências internas ou pedidos de vista que adiem o desfecho do caso.

Já na Primeira Turma, Alexandre de Moraes costuma garantir adesão aos seus votos e obter apoio uníssono dos colegas, construindo maioria sem dificuldade em casos mais politicamente sensíveis.

Em setembro, por exemplo, a Primeira Turma confirmou por unanimidade a suspensão da plataforma de Elon Musk, que relutava em cumprir decisões judiciais de remoção de perfis, não pagava multas milionárias e se recusava a designar um representante legal no país.

Apenas Luiz Fux fez uma ressalva pontual em seu voto, contra a aplicação indiscriminada da multa de R$ 50 mil a todo mundo que recorresse ao VPN para acessar a rede social.

Conhecida como “câmara de gás” devido ao perfil “linha dura” dos magistrados, a Primeira Turma é formada por Moraes, Fux, Cármen Lúcia e pelos dois ministros indicados pelo presidente Lula ao STF neste terceiro mandato: Cristiano Zanin e Flávio Dino.

Conforme informou O GLOBO, o grupo tem histórico de alinhamento a Moraes em casos de maior repercussão, como o do X e o recebimento da denúncia contra os acusados de planejar o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes, em 2018.

Se a denúncia dos golpistas fosse levada a plenário, também participariam do julgamento o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, além dos cinco ministros da Segunda Turma do STF, colegiado considerado de perfil mais “garantista” (mais inclinada a acolher os argumentos da defesa de investigados): Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Edson Fachin e os dois ministros indicados por Bolsonaro em seu mandato – Kassio Nunes Marques e André Mendonça.

Seguindo o regimento
Apesar das críticas nos bastidores, Moraes está amparado no regimento interno do Supremo. Isso porque, em dezembro do ano passado, o plenário do STF aprovou uma mudança regimental que devolveu às Turmas a competência de julgar denúncias e ações penais. Os casos são julgados pela turma em que está o relator.

Aliados de Moraes apontam que o novo entendimento foi unânime – e observam que, já naquela época, se sabia que os futuros casos relacionados ao 8 de Janeiro seriam enviados para a Turma, mantendo no plenário somente os processos onde já havia denúncia pronta para análise dos 11 integrantes do tribunal.

Ou seja: Moraes considera que não haveria motivos para nenhum desconforto agora, já que as novas regras pavimentaram o caminho para Bolsonaro ser julgado futuramente pela turma.

Para os ministros, a mudança no regimento era importante para descongestionar o plenário da Corte, já que só as investigações em torno dos atos que resultaram na invasão e na depredação da sede dos três poderes em Brasília, em 8 de janeiro de 2023, levaram à abertura de mais de mil ações penais, congestionando, assim, a pauta do plenário.

A alteração também atendeu a um pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que queria garantir o direito de os advogados fazerem suas sustentações orais em julgamentos preferencialmente presenciais – e evitar a discussão de casos no plenário virtual da Corte, em que as defesas gravam suas manifestações e as disponibilizam na plataforma digital, sem ter a certeza de que estão sendo mesmo ouvidas pelos magistrados.

Agora, com o julgamento na Primeira Turma, o temor de uma condenação por parte dos investigados na trama golpista só aumentou.

 
 
Fonte: O Globo

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